Voando solo, olhando as estrelas...
Antigamente, nos velhos tempos da aviação romântica, nós realmente pilotávamos os aviões... Hoje não; hoje os pilotos simplesmente monitoram os computadores de bordo. E estes, sim, são seus verdadeiros e “ilegítimos” pilotos. Antigamente havia de tudo nos aviões:- - piloto, copiloto, “engenheiro de vôo”, radiotelegrafista, navegador, artilheiro de cauda, de nariz, operador de radar, bombardeador; as vezes até capelão rsrsr... Era tanta gente nos aviões, principalmente nos aviões de bombardeios... -- B-17, B-26, B-29, o “Enola Gay” do coronel Paul Tibbets, o que lançou a bomba atômica sobre Hiroxima... Hoje, não; os pilotos fazem tudo isto, e bem melhor. O GPS, o Transponder, ILS, as bombas e os mísseis guiadas a “laser”, ajudam, e ajudam muito. Os rádios dos aviões hoje falam com o mundo inteiro... Quanta diferença daqueles tempos do “dididada” dos sinais telegráficos...
Quando eu era tenente “pica fumo”, passava horas, dias, meses, anos dando instrução de vôo no estágio avançado para os cadetes do último ano, em Pirassununga. Eram quatro, às vezes cinco duplos por dia, ensinando loopings, tunôs, todos os tipos de acrobacias; ensinando vôo de grupo, no dorso, noturno, todos os tipos de aproximações para o pouso... Ensinávamos e aprendíamos ao mesmo tempo... Aprende-se muito ensinando os outros a voar; temos que estar sempre muito atentos; qualquer descuido pode ser fatal; não é como ensinar alguém a dirigir carros...
E quem voasse mais tinha como prêmio pegar o “seu T-6”, e ir passar o fim de semana na sua cidade preferida... Como a “minha namorada” (estou preso nos seus encantos há mais 45 anos... rsrsr) morava em Natal e era para lá que “aproava” o meu avião uma vez por mês; ou de dois em dois meses... Decolava de Pirassununga logo após o término do expediente de sexta feira. A única condição era estar pronto para o serviço, na segunda pela manhã... A viagem era longa e cansativa, pois tinha que voar “noturno” e sozinho no meu vagaroso T-6, que não puxava mais do que 140 milhas, mais ou menos 240 quilômetros por hora... Para matar o sono, pernoitava alguns “minutos” em Ilhéus. E decolava bem cedo para almoçar uma gostosíssima carne de sol em Natal.
Hoje estou aqui a lhes contar essas amenidades, essas recordações sempre ligadas aos ares azuis do céu do meu Brasil... Ora voando a favor, ora contra os ventos; ora olhando a lua, o olho frio dos céus... Ora “namorando” as Plêiades, as sete irmãs da constelação “Touro”... A Aldebarã ... A Belatrix... As Três Marias, no cinturão do Orion... A Sirius, A Canopus... Mas como tudo aquilo me embriagava com sua beleza. Por alguns momentos esquecia-me de mim mesmo; esquecia-me até da minha própria vida; sentia-me livre e como que dissolvido no vento e nas águas das chuvas... Quantas vezes eu colocava a mão para fora da cabine, e os pingos mais pareciam alfinetadas. Recolhia um pouco daquelas águas geladas e passava no rosto, para espantar o sono... Sentia-me livre e além, muito além dos temores pequeninos e das mesquinhas ambições humanas... O meu piloto automático era as minhas mãos já cansadas, mas segurando firme o “manche” do meu às vezes nervoso avião...
Sempre gostei de voar solo, de me sentir livre e independente; cada vez mais individualista, como sempre gostei de ser...
Coronel Maciel.
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