Decolamos de Carauari, cidadezinha
plantada nas margens do Juruá. Chovia muito. As freiras, as freirinhas, os
padres, os índios, as índias e pajés; havia também macacos, papagaios,
tartarugas, todos voando a bordo do meu valoroso Dakota C-47. Voávamos entre o
rolar dos trovões...
Mais de 40 pessoas a bordo, bem acima do
previsto, mas dentro do peso normal. No coração dos Dakotas, voando pela
Amazônia, sempre havia lugar “pra mais um”. Aqueles passageiros ribeirinhos é
que estavam bem abaixo do peso normal.
Decolamos, nariz pra
cima, chegamos aos dez mil pés. No meio
do caminho entre Carauari e Eirunepé, a cabeça de uns dos enormes cilindros voou
pelos ares, quase levando a carenagem do motor esquerdo. O meu copila era um
tenente novinho, R2, que fazia sua primeira viagem sobre a densa floresta amazônica.
Quando ele viu o motor pegando fogo (ele estava do lado esquerdo, na posição de
primeiro piloto) ficou pálido de espanto, desmaiou, dizendo que íamos morrer. E foi bem melhor assim. Sozinho, livre dos “conflitos de cabine”, ficamos
também livres para tomar nossas decisões. Eu, pelo menos, gosto de ser assim.
Para encurtar a
história: o que seria uma hora de voo transformou-se em duas horas de extremo
sufoco, passageiros gritando e chorando, voando baixo, sobrevoando o Rio Juruá
que é muito, mas muito sinuoso, pois, pensava eu, se o motor direito pifar, eu
me jogo sobre o rio, livrando das enormes árvores, castanheiras com mais de dez
“andares” de altura, rodeadas de bilhões de mosquitinhos, onças, cobras e
jacarés.
Conseguimos chegar a
Eirunepé já no “lusco-fusco”, quando, acredite quem quiser, fui carregado pelos
ares como verdadeiro herói pelos incrédulos passageiros!
E foi só na hora do
jantar oferecido pelo prefeito, que estava alegre, risonho e feliz por termos
salvo sua família inteira que estava a bordo do nosso heroico C-47; e só depois
de tomar um copo bem generoso da “branquinha”, foi que senti minhas pernas
tremerem, lembrando da minha mulher e dos meus filhos ainda pequenos que
deviam estar em casa, em Belém do Pará, alegres e brincando, sem
desconfiarem de nada.
Quem escapa de um perigo,
ama a vida com máxima intensidade...
Coronel Maciel.
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