Sargento Berenaldo. ( Repeteco, a pedidos...)
Duas grandes decepções na vida: - - Uma, conseguir o que se quer; outra, não conseguir. Não sou filósofo, mas arrisco esta filosofia barata: - - Nunca se esquece a mulher que nunca nos quis. Berenaldo era Sargento Telegrafista servindo no Destacamento de Proteção ao Voo, em Parnaíba, e sonhava, como todos nós sonhamos, um belo dia acertar na loteria. Naqueles bons tempos não havia a “Mega-Sena”. Só havia a recém-criada Loteria Esportiva. E o Berenaldo acertou sozinho o grande prêmio. Foi assim que ele me contou como fez para acertar “sozinho” os três cartões: - - Preencheu-os somente com o que ele considerou como sendo grandes “zebras”; depois foi enxertando os cartões com os palpites considerados lógicos. E no domingo, à tardinha, sozinho, ou melhor, sozinho, não: -- acompanhado da sua garrafa de cana, foi ouvir o resultado dos jogos no seu radinho de pilha, numa das belas praias de Parnaíba; olhando esperançoso lá longe, onde as paredes do céu se encontram com as águas verdes e bravias dos mares do Atlântico. E foi acertando, acertando, acertando e quando viu, estava rico! Rico “pra caralho”; ganhou mais ou menos o que representa hoje uma mega-sena acumulada! Na época eu era um pobre Major-Aviador e servia no Serviço Regional de Proteção ao Voo, SRPV-2, em Recife, a minha querida “Veneza Brasileira”. Berenaldo quando se viu assim tão rico, “ensandeceu” -- como diria o nosso grande Machado de Assis nos seus lindos versos, a “Mosca Azul”. “Zerou” as dívidas de todos seus amigos militares que serviam no Destacamento, e foi se meter no ramo de Supermercados, em Teresina, quando fez então a sua primeira grande, digamos, “cagada” -- trocou de “madame”; deixou a sua antiga e fiel companheira, que entrou na justiça e levou grande parte da sua grande “sorte”. Berenaldo era muito bom no “dididadá” das antigas teclas de telegrafia, mas não era nada bom em finanças; não sabia mexer com tanto dinheiro. Mas antes de fazer “outras”, Berenaldo sumiu; entrou em "Destrefa”: -- Desertou. Resolveu se “apresentar” depois de várias semanas, na sede do SRPV, que ficava numa área dentro da Base Aérea de Recife. Berenaldo chegou todo nos "trinques”: -- Paletó branco todo engomado, sapatos pretos de verniz; unhas bem tratadas, um perfeito play-boy internacional; um verdadeiro paisano. Convidei-o para um cafezinho, e fiquei admirando uma pessoa que, de repente, ficou milionário. Muito rico mesmo. Berenaldo sempre foi uma ótima pessoa; muito ingênuo e muito humano. Entrou no “meu gabinete”, sentou-se, e foi logo me dizendo: - - Major Maciel, vim pedir minhas contas da FAB. Mas, antes, me perguntou, bem baixinho, pra ninguém ouvir: - Major Maciel, o senhor está precisando de “alguma ajuda”? Respondi, brincando: – “Sargento Berenaldo” – considere-se preso! – Primeiramente você vai responder processo por crime de deserção. Mas a “mamãe” FAB poderá facilitar muito sua nova vida de milionário, caso você aceite entrar de “Licença Especial”, a partir do dia da deserção, coisa que eu já falei com o Brigadeiro e ele concordou. -- Isto para quebrar seu galho, eu disse brincando. E ainda lhe disse que esta era a sua melhor opção. Passar seis meses estudando a melhor maneira de aplicar tanto dinheiro. Mas de nada lhe serviram os meus conselhos. Berenaldo nos disse adeus e partiu. -- Partiu, mas parece que não foi nada feliz. -- Afeito a só "martelar" nos aparelhos de telegrafia perdeu tudo; hoje não tem dinheiro nem pra gasolina do carro, assim fiquei sabendo, pois nunca mais o vi. -- Alguém sabe me dizer por onde anda o nosso grande amigo, o Sargento Berenaldo?
Coronel Maciel.
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