Há muito de poeta nas almas dos
pilotos.
Ontem, naqueles velhos
tempos da aviação romântica, tempos “idos e vividos” nós realmente pilotávamos
aviões. Hoje, nem tanto. Hoje os pilotos monitoram os seus computadores de
bordo. Estes, sim, são seus verdadeiros e “ilegítimos” donos. Antigamente havia
de tudo naqueles velhos nossos aviões: - piloto, copiloto, mecânico,
radiotelegrafista, navegador, artilheiro de cauda, de nariz, operador de radar,
bombardeador; às vezes até Capelão! B-17, B-26, B-29, o “Enola Gay” do coronel
Paul Tibbets, o da Bomba Atômica sobre Hiroxima; bomba que eu pensava ser maior,
muito maior, que a porta da cozinha lá de casa... Quando Tenente novinho, “pica
fumo”, eu passava horas, dias, meses, anos dando instrução de voo no Estágio
Avançado para os Cadetes do último ano, na Academia da Força Aérea, em Pirassununga.
Eram quatro, cinco duplos por dia: partida do motor, rolagem, decolagem;
subida, manobras, acrobacias; voo de grupo, no dorso, mais acrobacias; descida
para o pouso; pilofe! – Nunca esquece, cadete, de baixar o trem de pouso;
pousar sem trem é pior que perder pênalti! Ensinávamos e aprendíamos ao mesmo
tempo. Aprende-se muito ensinando “Cadetes” a voar. Há de se estar sempre
atento; “olho vivo no inimigo”; o primeiro descuido pode ser o fatal.
E aquele tenente
novinho que voasse mais recebia como prêmio pegar o “seu T-6”, e ir passar o
fim de semana na sua cidade preferida; Natal era uma das minha; era pra lá que
“aproava” o meu T-6 quase todos os meses. E como Natal era longe! Decolava de Pirassununga logo após o término
do expediente das sextas feiras. A única condição era estar pronto para o
serviço, na segunda pela manhã. A viagem era longa; noturnão; sozinho, como eu
gostava, no meu vagaroso T-6, que não puxava mais do que 140 milhas. Para matar
o sono, pernoitava alguns “minutos” em Ilhéus. E decolava bem cedo para almoçar
uma gostosa carne de sol em Natal.
Hoje estou aqui a lhes
contar essas amenidades; essas recordações sempre ligadas aos ares azuis dos
céus do meu Brasil. Ora voando a favor, ora contra os ventos; ora olhando a
lua, o olho frio dos céus; ora “namorando” as Plêiades, as sete irmãs da
constelação “Touro”. Aldebarã, Belatrix; as Três Marias, no cinturão do Orion.
Sirius, Canopus. Mas como tudo aquilo me
embriagava com sua imensa beleza. Por alguns momentos esquecia-me de mim mesmo;
sentia-me livre; dissolvido no vento e nas águas frias das chuvas. Quantas
vezes eu colocava a mão para fora da cabine, e os pingos mais pareciam
alfinetadas. Recolhia um pouco daquelas águas geladas e passava no rosto, para
espantar o sono. Sentia-me livre e além, muito além dos temores pequeninos e
das mesquinhas ambições humanas. O “Piloto Automático” era as minhas mãos já
cansadas, mas segurando firme o “manche” do meu saudoso e inesquecível “NA
T-6”...
Coronel Maciel.
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