Como eram fortes,
amigos, fiéis, corajosos os “Dakotas” dos nossos velhos tempos na minha querida
Força Aérea! E eram iguais a coração de mãe: sempre cabia mais um. Decolamos de
Cururu para Jacareacanga com a garça pesadona; cheia! Em Jacaré, encheu mais
ainda; lotada. Foi quando o nosso Tenente--Médico veio-me dizer que havia uma
menina de uns dez anos, com “malária nervosa” e que precisava ser transportada
de qualquer maneira para Santarém. Malária, como vocês sabem, tem cura; exceto
a primeira...
“Arquitetamos” uma rede no C-47 e decolamos. O
calor, infernal; a umidade do ar, maior ainda, o que exigia esforço extra da
velha garça, de “barriga cheia”. A criança, deitada na rede, ardia de febre.
Informei Santarém que estávamos executando MMI (Missão de Misericórdia) e
solicitei a presença de ambulância no pouso.
Perto de Itaituba “o
médico” me comunica a morte da criança. Chamei à cabine o pai, e perguntei: - -
O que é que o senhor quer que eu faça? Ele me pediu pelo amor de Deus, chorando,
que eu voltasse à Jacaré, pois em Santarém seria mais um grande problema, além
da sua grande tristeza.
Não tive dúvidas;
cancelei a MMI, rumo inverso e regressamos à Jacaré. Era grande a tristeza
dentro da velha garça. Pousamos. Dei um longo abraço no velho, e voltamos para
Santarém.
Pernoitamos em
Santarém, marcando a decolagem para Belém no dia seguinte, sábado, bem cedo.
Quando eu fui chegando para decolar, assisti a mais hilariante das indisciplinas:
o mecânico, “Sargento P.”, hoje falecido, estava completamente “ébrio”, com um
papagaio no ombro, igualzinho àquele pirata do “Rum Bacardi”. O papagaio, ele
havia conseguido em Cururu. Nu, da cintura p’ra cima; na mão direita uma
camiseta. E, assim como um “boiadeiro levando a boiada”, ele ordenava aos
atônitos passageiros que embarcassem logo, “pois o Major Maciel já está chegando”.
Decolamos. Mandei que
P. fosse dar uma “cochilada” e fiquei pensando no que fazer. Após o cochilo,
ele veio, assim meio sem jeito, conversar comigo. E conversamos um tempão. Não
sei se foi pela morte da criança, ou quais motivos outros, mas o P. então me
contou que aquela foi uma grande e infeliz recaída, pois estava em tratamento
na irmandade de ajuda mútua “AA” (Alcoólicos Anônimos) em Belém, há mais de um
ano, na esperança de se livrar da "Marvada Pinga". Na Ordem de Missão,
eu relatei somente o caso da menina; o caso do sargento, não. O P. poderia até
ser expulso da FAB, pois o Brigadeiro não iria perdoar.
Mas tudo, tudo, tudo
chegava de imediato aos ouvidos do Brigadeiro. Logicamente que eu iria levar
“cuidadosamente” o caso ao conhecimento do Comandante do Esquadrão, Segunda Feira,
primeiro dia útil. Mas fui logo chamado para me justificar, na Segunda, bem cedo:
- No caso da menina, o Brigadeiro queria saber por que eu não havia consultado
o Esquadrão antes de regressar à Jacaré. Tentei explicar que não haveria tempo
útil, além das conhecidas dificuldades de comunicações etc., e coisa e tal. Minha
justificativa não agradou. Disse-me, irritadíssimo, entre outras coisas, que
nós precisávamos deixar de pensar “que o avião era nosso”, e que havia “Ordem
de Missão” para ser cumprida.
No caso do sargento eu
falei que não transcrevi no Relatório de Voo porque eu achava que o caso era
mais de compreensão, que de prisão; e no caso da menina, eu terminei falando que
não me comuniquei com o Esquadrão porque, estivesse ou não autorizado, eu
voltaria para Jacaré.
Meus “amados ouvintes”:
não façam ideias erradas de mim. Sabemos muito bem dos rigorosos Estatutos e
Regulamentos Disciplinares que estão aí a nos dizer o que cada um de nós é; o
que cada um de nós não é; o que cada um de nós pode; e o que cada um de nós não
pode.
Mas foi por essas e
outras que eu costumava entrar nos Quadros de Acesso por Antiguidade; mas
sempre ganhei em todos os recursos. Sempre fui promovido por Merecimento.
Imaginem! Mas nunca deixei de dar este conselho aos mais “novinhos”: - - Façam
o que eu digo, mas não façam o que eu faço... Regulamento também é “Bom Senso”...
kkkkkkk
Coronel Maciel