segunda-feira, 24 de dezembro de 2018

PILOTOS E POETAS.


            Há muito de poeta nas almas dos pilotos.
Ontem, naqueles velhos tempos da aviação romântica, tempos “idos e vividos” nós realmente pilotávamos aviões. Hoje, nem tanto. Hoje os pilotos monitoram os seus computadores de bordo. Estes, sim, são seus verdadeiros e “ilegítimos” donos. Antigamente havia de tudo naqueles velhos nossos aviões: - piloto, copiloto, mecânico, radiotelegrafista, navegador, artilheiro de cauda, de nariz, operador de radar, bombardeador; às vezes até Capelão! B-17, B-26, B-29, o “Enola Gay” do coronel Paul Tibbets, o da Bomba Atômica sobre Hiroxima; bomba que eu pensava ser maior, muito maior, que a porta da cozinha lá de casa... Quando Tenente novinho, “pica fumo”, eu passava horas, dias, meses, anos dando instrução de voo no Estágio Avançado para os Cadetes do último ano, na Academia da Força Aérea, em Pirassununga. Eram quatro, cinco duplos por dia: partida do motor, rolagem, decolagem; subida, manobras, acrobacias; voo de grupo, no dorso, mais acrobacias; descida para o pouso; pilofe! – Nunca esquece, cadete, de baixar o trem de pouso; pousar sem trem é pior que perder pênalti! Ensinávamos e aprendíamos ao mesmo tempo. Aprende-se muito ensinando “Cadetes” a voar. Há de se estar sempre atento; “olho vivo no inimigo”; o primeiro descuido pode ser o fatal.
E aquele tenente novinho que voasse mais recebia como prêmio pegar o “seu T-6”, e ir passar o fim de semana na sua cidade preferida; Natal era uma das minha; era pra lá que “aproava” o meu T-6 quase todos os meses. E como Natal era longe!  Decolava de Pirassununga logo após o término do expediente das sextas feiras. A única condição era estar pronto para o serviço, na segunda pela manhã. A viagem era longa; noturnão; sozinho, como eu gostava, no meu vagaroso T-6, que não puxava mais do que 140 milhas. Para matar o sono, pernoitava alguns “minutos” em Ilhéus. E decolava bem cedo para almoçar uma gostosa carne de sol em Natal.
Hoje estou aqui a lhes contar essas amenidades; essas recordações sempre ligadas aos ares azuis dos céus do meu Brasil. Ora voando a favor, ora contra os ventos; ora olhando a lua, o olho frio dos céus; ora “namorando” as Plêiades, as sete irmãs da constelação “Touro”. Aldebarã, Belatrix; as Três Marias, no cinturão do Orion. Sirius, Canopus.  Mas como tudo aquilo me embriagava com sua imensa beleza. Por alguns momentos esquecia-me de mim mesmo; sentia-me livre; dissolvido no vento e nas águas frias das chuvas. Quantas vezes eu colocava a mão para fora da cabine, e os pingos mais pareciam alfinetadas. Recolhia um pouco daquelas águas geladas e passava no rosto, para espantar o sono. Sentia-me livre e além, muito além dos temores pequeninos e das mesquinhas ambições humanas. O “Piloto Automático” era as minhas mãos já cansadas, mas segurando firme o “manche” do meu saudoso e inesquecível “NA T-6”...
Coronel Maciel.


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