Foi a pergunta que eu
fiz hoje ao meu velhíssimo barbeiro. --
Eu? – Quem sou eu, velho corona! -- Eu nunca andei, nem nunca cheguei nem perto
de nenhum desses aviões, me diz ele com a sua afiada navalha na mão! Tenho medo
só em pensar de andar de avião.
Depois de anos e anos cortando
meus eternos cabelos brancos, ele agora deixou crescer certas “intimidades”
comigo: -- me chama de “velho corona”, e eu, de “fígaro velho”; não o lá de “Sevilha”,
mas este aqui de Natal.
Já cortastes cabelos de alguém da família
Alves, pergunto-lhe brincando. -- Não; nunca tive essa felicidade. Conheci o
velho Aluísio Alves, nos velhos tempos quando dos seus comícios nas campanhas
para governador. Aluísio Alves, aquele que foi cassado “por corrupção”, na
época que “você” mandava, lembra? – Aluísio, pai do Henrique, primo do Garibaldi,
esses que agora estão aí no topo da lista dos mais bem sucedidos na vida, e
armando essas grandes confusões, passeando pra lá e pra cá, sempre numa boa nos
teus lindos aviões! -- Meus não! -- Nossos aviões! -- Meus, teus, nossos
aviões!
Eu também, barbeiro velho, nunca tive a
felicidade de viajar, nem muito menos pilotar esses aviões tão lindos, limpos,
bem tratados e muito bem equipados aviões do GTE, Grupo de Transporte da FAB
especializado no transporte de “altíssimas autoridades”. Pilotei
muito os meus velhos aviões Dakotas, os bravos, os “bravíssimos” C-47, que só
transportava índios, soldados para os pelotões de fronteiras, padres, freiras,
freirinhas até bispos, pelas florestas amazônicas, esses mesmos padres e bispos
que vivem longe, muito longe, dos
palácios do Vaticano... -- Lá vem você falando mal dos pobres padres e bispos! -
-- Olha que o papa vem aí, e ele vai te castigar! -- diz ele acompanhado de
sonoríssima gargalhada.
Conversa vai, conversa
vem, tentei lhe explicar da maneira mais simples possível como acontecem essas
grandes bandalheiras nos jatinhos da FAB: -- É fácil, muito fácil, passear nos
jatinhos da FAB; basta que essas autoridades tipo -- “sabe com quem está
falando” -- solicitar algum deles, dizendo que vai viajar em “missão oficial”; por
exemplo: assistir a casamentos de compadres e comadres; partidas de futebol;
passeios à ilha Cubana ; à ilha de
Fernão de Noronha – mas sempre alegando que vai em “missão oficial”, sempre a
serviço do governo, mesmo levando a
bordo noivas, noivinhas, “namorados”, namoradinhas, amantes, coisinhas assim. E
fica fácil, muito fácil, quando descoberta a "sacanagem", dizer que vai “ressarcir”
a nação com míseros cruzados, quando na realidade deveria ser-lhes cobrado o
mesmo valor que seriam cobrados no caso de fretamento de aviões do mesmo tipo,
em companhias de “Taxi Aéreo”, o equivalente a pouco mais ou menos vinte e
cinco mil cruzados, por hora de voo!
“Ah que saudades que eu
tenho da aurora da minha vida, da minha infância querida que os anos não trazem
mais”...
Coronel Maciel.