Já fiz várias vezes a
rota “Jacareacanga – Cachimbo”. Mas somente em voo visual diurno. Voar noturno
sobre a densa floresta amazônica era muito perigoso. Hoje nem tanto. Hoje os
pilotos contam com a ajuda dos fabulosos GPS. Impossível se perder... Mas
naquela época, fazer o trajeto de C-47, não era nada agradável. As distâncias
entre as cidades são enormes e contávamos somente com o auxílio dos rádios faróis,
nem sempre confiáveis, principalmente à noite, quando mais se precisa.
Foi num dia de junho de
1967 que o Destacamento de Proteção ao Voo de Cachimbo, no sul do Pará, sofreu “ameaça
de invasão” por cerca de 100 índios. Na realidade não se pode afirmar que houve
essa ameaça. Mas os militares da FAB ali destacados, sozinhos no meio da mata,
imaginaram que sim e solicitaram reforço urgente de Belém, sede da então
Primeira Zona Aérea, de onde eram enviados suprimentos materiais “e humanos”
para dezenas e dezenas de outros destacamentos, situados na imensa região
amazônica.
Bom. – Mas o que eu queria lhes contar,
rapidamente, foi o desencadeamento de uma grande tragédia, que culminou com a
morte de vinte pessoas e o resgate de cinco sobreviventes. Foi assim: -- De
Belém decolou um C-47 com uma tropa armada de 23 militares, mais um índio
aculturado. Não vou agora descrever as polêmicas que se criaram se o Brigadeiro
Comandante da Primeira Zona Aérea deveria ou não ter autorizado a decolagem de
Belém para Jacaré, e de lá para Cachimbo, este trecho totalmente em “voo por
instrumentos” noturno, com equipamento de navegação apresentando “panes
intermitentes”. Mas, era uma missão considerada “missão de guerra”.
Prevendo problemas,
decolaram de Jacaré para Cachimbo “full tanques”, o que dá uma autonomia de
oito horas. Após o tempo estimado de voo, não conseguiram avistar, nem
conseguiam receber os sinais do rádio farol de Cachimbo. Fizeram o procedimento
previsto para o caso, abrindo para um “Quadrado Crescente”, sem sucesso... Resolveram então regressar para Jacaré. E não
conseguiram também nem avistar, nem receber os sinais do rádio farol de Jacaré.
Estavam “perdidos” e “mal pagos”. A tendência para quem se perde,
principalmente na Amazônia, é perder-se cada vez mais. E foi o que aconteceu. Aproaram
Manaus, na esperança de “se acharem”. Mas nada de Manaus chegar... Quando se
está perdido, sente-se um gosto de merda na boca... É horrível. Voaram, voaram
e voaram, completamente perdidos, e foram cair devido “pane seca” num lugar que
o SALVAERO, o serviço de “Busca e Salvamento” da FAB, nunca poderia imaginar.
Perto de Tefé!
Foi realizada uma das
maiores operações de Busca e Salvamento já realizadas no mundo, que perdurou
por vários e longos dias. Os cinco sobreviventes contam que os “urubus-reis”, enormes
urubus de cabeças vermelhas, depois de gastos todas as munições para
espantá-los, comiam as carnes dos que iam morrendo... E quando foram finalmente
salvos, eles choravam e gritavam: -- “Nós sabíamos que vocês viriam”...
Nem sempre se pode
“voar” e ser feliz ao mesmo tempo...
Coronel Maciel.